sexta-feira, 14 de junho de 2013

A importância da humildade na carreira científica


Texto retirado do blog Sobrevivendo na Ciência Blog com dicas para quem está começando na Ciência A importância da humildade na carreira científica Publicado em 16/04/2013 A vaidade faz parte da natureza humana, assim como diversos outros sentimentos, sendo impossível classificá-los como absolutamente positivos ou negativos sem antes dar-lhes um contexto. Contudo, todo sentimento, quando em excesso, certamente traz prejuízos, principalmente para a própria pessoa. É o caso da vaidade, talvez o calcanhar de Aquiles de muitos cientistas e outros profissionais que seguem carreiras intelectuais. Em tempos de competição exacerbada, em que o individualismo impera, resolvi escrever sobre a vaidade acadêmica, a fim de dar um toque para quem está ingressando no Caminho do Cientista. A vaidade é o pior veneno para um neófito, tendo o potencial de cortar pela raiz uma carreira que poderia vir a ser brilhante. Como já dizia o Mestre Yoda, “a vaidade se tornou uma falha comum entre os Jedis”. Na verdade, os cientistas sempre tiveram a fama de serem vaidosos e egocêntricos, mesmo que isso não seja verdade para a maioria de nós. Em parte essa fama vem do ciúme que outras pessoas sentem de quem trabalha em profissões de alto nível, incluindo aí não só os cientistas, mas também artistas renomados, empresários de sucesso, grandes estadistas, sacerdotes importantes etc. Geralmente, anões intelectuais fazem de tudo para trivializar as conquistas dos gigantes. Só que, por outro lado, existem de fato muitos cientistas que acham que a Terra gira em torno dos seus umbigos. São pessoas tão vaidosas, que chegam até mesmo a desmerecer idéias brilhantes, apenas porque são contrárias às suas. Ou, quando esses caras têm algum poder político real, chegam a boicotar quem não segue sua cartilha. Geralmente colegas assim têm teorias e hipóteses de pelúcia e gostam de pensar que a natureza tem que seguir as leis que eles mesmos criam. Esse é o caso de alguns cientistas já estabelecidos. Alguns deles têm talento de fato, mas a arrogância os torna míopes ou até mesmo cegos. Sem saber, eles boicotam a si mesmos, pois sua cabeça dura fica impermeável a novidades e descobertas. Quando menos percebem, já estão estagnados na carreira. Se tinham algum renome no início, a partir desse ponto começam a perder importância gradualmente e a sua imagem vai se apagando até eles caírem no limbo da irrelevância acadêmica e se transformarem em peças de museu. A arrogância mata carreiras que chegaram a ser ou poderiam ter sido brilhantes. De que adianta ter emprego garantido, se o professor narcisista vira uma espécie de zumbi acadêmico? Só que a arrogância é muito mais prejudicial para os padawans, que estão começando a carreira. Neste artigo, tento alertar os neófitos sobre o problema, porque para eles ainda há esperança, já que cavalo velho não aprende truque novo. Nos anos de treinamento científico, quando passamos pela iniciação, o mestrado e o doutorado, devemos trabalhar muito para desenvolvermos as habilidades naturais que porventura tenhamos. É a famosa Regra das Dez Mil Horas, sobre a qual já falei antes (ok, o número exato de horas varia de pessoa para pessoa, mas a idéia da necessidade de um esforço gigante no começo da carreira corresponde bem à realidade). Aí é que está a pegadinha. Quem, seja lá por qual razão for, começa a pensar que já é um cientista pronto antes de o ser de fato, acaba relaxando e não se dedicando à própria formação o tanto quanto deveria. É aquela velha mentalidade tosca do “isso aí é muito fácil, não preciso estudar”. Meu chapa, mesmo os supostos gênios tiveram que estudar os respectivos assuntos de interesse a fundo e praticar, praticar e praticar, antes de despontarem naturalmente como outliers! Ninguém vira gênio ou expert só através do talento: é preciso treinamento e prática também. Infelizmente, essa terrível falha de caráter chamada “vaidade cega” se tornou um problema de enormes proporções, pois vivemos num tempo de competição exacerbada, que começa já no berço (leia-se iniciação científica). O mundo acadêmico oferece muito mais oportunidades agora do que há uns 10 anos, porém o número de pessoas interessadas nessas oportunidades cresceu ainda mais. É um mundo lotado de cientistas competindo por bolsas, empregos e grants. Vejo padawans, ainda não graduados, já se achando autoridades em assuntos que mal começaram a estudar. São pessoas imaturas e tolas, que participam obsessivamente de seminários ou redes sociais só para desdenhar o trabalho alheio, sendo blindados contra críticas direcionadas a eles próprios. Para reconhecê-los, pense naqueles coleguinhas que sempre fazem perguntas em qualquer tipo de apresentação, mesmo quando essas perguntas não acrescentam nada ou são até mesmo capciosas (é óbvio que ter curiosidade é essencial para um cientista, mas aqui estou me referindo àqueles que não perguntam compulsivamente por curiosidade, mas por vaidade). Pense também nos coleguinhas que nunca têm algo de positivo a dizer sobre colegas e professores. São aqueles sujeitos que parecem andar ao mesmo tempo com o nariz empinado e uma nuvem negra sobre a cabeça. Esses Anakins Skywalker, que muitas vezes ainda nem sabem manejar direito um sabre de luz, julgam-se mestres jedi logo após tomarem as primeiras lições. Isso também acontece com alguns, depois de lerem meia dúzia de papers ou, pior, quando ganham prêmios obscuros oferecidos em eventos pequenos, que têm algum significado apenas dentro de um círculo científico muito, muito específico (isso, se tiverem mesmo algum significado), mas que mesmo assim têm o poder de elevar jovens egos às nuvens. Vejo até mesmo alunos de iniciação científica posando de autoridades em redes sociais e sendo extremamente agressivos com os colegas, provavelmente numa tentativa de conquistar espaço na base do grito. Esse tipo de elemento eu chamo de “cientista pequinês”. Geralmente, isso tem uma certa correlação com ser um “aluno feral“. Além da importância do treinamento e da prática, que não canso de ressaltar aqui neste blog, devemos considerar também a importância da experiência. Mesmo se você tiver talento, já tiver recebido treinamento e já tiver praticado as suas dez mil horas, mantenha sempre a sua mente aberta. Ouça quem já trilha o Caminho do Cientista há mais tempo. Antes de criticar os mais velhos, seguindo o calor da juventude, preste atenção ao que eles dizem; não tente reinventar a roda. Muitas vezes, a experiência leva os seus colegas mais velhos a enxergarem ângulos de um determinado tema que você nem sonhava existirem. Não estou dizendo que idade (não a biológica, mas a científica) é sinônimo de sabedoria. Mas idade quase sempre é sinônimo de experiência. Respeite os mais velhos e suba nos ombros dos gigantes, se quiser enxergar mais longe. Portanto, colega neófito, se você ainda estiver em treinamento, tenha humildade. Ouça, peça conselhos, preste atenção, tenha paciência. Se você fizer o seu dever de casa com capricho, um dia será naturalmente reconhecido pelos seus pares. Estou dizendo isso para o seu próprio bem.